quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

De peixes

Sabe um peixe? Desses que vivem no mar? Então. Essa história é sobre um que vivia no ar. Nasceu ouvindo dizer que era pássaro e, como tal, permaneceu com a existência sendo carregada por correntes que o levavam aos lugares aonde são levados os pássaros que se prezam. Mas, no caminho que o levava a esses lugares, sempre reparava num brilho forte que vinha d’algum lugar abaixo de si e que o acompanhava desde a sua primeira viagem de pássaro. O brilho vinha de uma coisa grande, que ele não conseguia dinstinguir, mas que se agigantava horizonte afora em pura luz. Um dia ele ouviu, sem querer, numa dessas conversas que ave-grande promove e que só ave-grande entende, que aquele brilho vinha de uma coisa chamada "Mar", onde viviam criaturas desconhecidas, seres perigosos, devoradores de pássaros - vejam bem: peixes devoradores de pássaros. Mas o nosso peixe aqui era dado a reflexões de cunho filosóficocríticometafórico e pensou ora, mas se “mar” se parece tanto com “ar”, se são distintas apenas por uma letra de sonoridade quase muda, ora, se nós, pássaros, vivemos no ar não podemos ser muito diferentes das criaturas viventes do mar e o que nos separa é apenas um quase-silêncio. Foi com esse pensamento que o nosso amigo resolveu desbravar o mar e, na primeira oportunidade, tomou rumo. Sem bem saber como fazia, rasgou o ar numa velocidade meteórica e, como num arrebatamento, mergulhou nas profundezas de um universo totalmente novo e – pasmo percebeu – totalmente seu! Sentiu suas vias respiratórias relaxarem como nunca havia sentido; deixou-se levar pelas correntes marítimas com a naturalidade de quem nascera pr’aquilo; nadou numa velocidade infinitamente maior com a qual jamais voara.
E sentiu-se bem. Sentiu-se ele. Sentiu-se peixe.